16.5.07

TELETRANSPORTE

"Velocidade e prazer", ronrona o vozeirão maroto de locutor tarado na instrumental "Guitarrada". É piada, claro, mas talvez nenhuma frase proferida com todos os rigores da mais vetusta hermenêutica sintetizasse melhor a violência do turbilhão de sinapses estroboscópicas de quem se submete à audição do quarto álbum de estúdio do Autoramas.
Mais sombrio que os antecessores - Estresse, Depressão & Síndrome do Pânico (2000), Vida Real (2001) e Nada Pode Parar Os Autoramas (2004) - e decerto o melhor de todos, Teletransporte é uma pisada suicida no acelerador que provocou uma bela guinada na carreira da banda de rock mais bacana, mais independente e, ainda bem, mais teimosa do Brasil.
Os marketeiros gagás que o digam! Seja qual for a direção para onde apontam os osciloscópios embutidos nos corações aventureiros de Gabriel Thomáz (vocal & guitarra), Bacalhau (bateria & homem-eletrônico) e Selma Vieira (baixo & vocal), os carrinhos seguem sem freio na pista certa. A pista de dança. Nem precisava, mas em Teletransporte Gabriel prova mais uma vez porque merece a fama de hitmaker imbatível. O cara se superou nos vocais, ora rasgados e desesperadamente furiosos - vide a irresistível "Eu Mereço" e o genial refrão angustiado de "Surtei" -, ora lânguidos, como na deliciosa "O Inesperado", e nos indefectíveis riffs neuróticos que são sua marca registrada - como no tiroteio de bass synthesizer da soturna "Fazer Acontecer", na festa pronta de "Mundo Moderno" e na lasciva "Hotel Cervantes".
As palhetadas do guitar hero candango estão cada vez mais precisas. Te cuida, Dick Dale. Por sua vez, Selma, a baixista mais invocada dos trópicos, não se faz de rogada e também arrebenta nos vocais na dobradinha com Gabriel em "Já Cansei De Te Ouvi Falar". Grande garota! Muito melhor do que a macaca louca que tocava na banda antes dela. E o Bacalhau... bem, o Bacalhau... Que dizer da sua viril performance?! Meras palavras não bastariam para descrever essa máquina do ritmo quente, do sexo animal e adjacências.
E assim, revigorado, melhorado e assessorado pelos produtores Kassin e Berna Ceppas, o Autoramas cometeu a promessa de melhor álbum do ano. "A 300 km/h" faria Roberto Carlos rodopiar sobre a perna mecânica. Ops, esqueci, ele pensa que ninguém sabe. Vejamos... "A 300 km/h" é uma grande canção romântica, uma grande canção, simples assim. Nem Roberto faria melhor. Muito menos de perna mecânica. Por falar em Jovem Guarda, imprescindível citar a estupenda participação do Rei dos Teclados, Lafayette, na magnífica "Panair do Brasil". Joana Ceccato, da banda paulista Biônica, é outra convidada especialíssima, que arrasa numa locução surreal na inacreditável versão de "Digoró", uma música, ou melhor, uma coisa louca dos brasilienses da Radical Sem Dó. Enfim, Teletransporte é outra coleção emocionante de músicas que falam da história da vida de cada um.
Uma história que o Autoramas tem autoridade de sobra pra contar. A história de cada incompreendido, de cada outsider. A história de toda vanguarda, de toda esperança. Exagerei, e daí?
Agora foda-se.

Simone do Vale - ex-baixista do Autoramas

É amigo.. sábado o bicho vai pegar ;D

até pessoas!
Mastiguem bastante antes de engolir!
:*